Monday, June 01, 2009

ODE AO POETA ARY DOS SANTOS - Le Cul

Atenção: a ode não é o poema que se transcreve a seguir, que é do Ary dos Santos. Para ouvir a ode, declamada, clique no botão de PLAY, na imagem acima.

  • A cidade é um chão de palavras pisadas
  • a palavra criança a palavra segredo.
  • A cidade é um céu de palavras paradas
  • a palavra distância e a palavra medo.
  • A cidade é um saco um pulmão que respira
  • pela palavra água pela palavra brisa
  • A cidade é um poro um corpo que transpira
  • pela palavra sangue pela palavra ira.
  • A cidade tem praças de palavras abertas
  • como estátuas mandadas apear.
  • A cidade tem ruas de palavras desertas
  • como jardins mandados arrancar.
  • A palavra sarcasmo é uma rosa rubra.
  • A palavra silêncio é uma rosa chá.
  • Não há céu de palavras que a cidade não cubra
  • não há rua de sons que a palavra não corra
  • à procura da sombra de uma luz que não há.

Ouça este poema musicado e cantado pelo Zeca Afonso.

O Ary dos Santos foi um dos maiores poetas da segunda metade do século XX e a sua morte prematura impediu que a torrente impetuosa, expressiva e profundamente humana que brotava da sua pena continuasse a dar-nos poemas belíssimos como o que acima vos deixei.

8 comments:

Fátima Santos said...

-de gosto diminuto
para não dizer baixote
para não dizer, de caras:
-porra! que mau gosto!
e dizendo assim
óbvio,
não digo tudo,
mas aqui me fico
e me vou
mudo

Marques Correia said...

Independemntemente dos méritos do artista, a ode está uma delícia, com um ritmo e uma métrica muito bem conseguidas.

E o conteúdo também não está nada mal...

Digo eu, vá!

mac said...

Maria de Fátima, vai-te catar.
Atenta:
"Não há céu de palavras que a cidade não cubra
não há rua de sons que a palavra não corra
à procura da sombra de uma luz que não há.
"
Quando eu escrever qualquer coisa com um décimo deste talento, poderei dizer que a minha vida aproveitou a alguém que não só a mim.

Fátima Santos said...

ESCLARECIMENTO
antes que acontecesse, eu deveria ter feito a adenda
não fiz
o mal
o mau gosto a que aludo é exclusivo do poema dito no filme (nem falo do filme em si...)
e é AINDA MAIS E SOBRETUDO do POST que mistura de modo feio dois poemas : um belíssimo com um filme à altura do poema e o um poema e respectivo filme de gosto duvidoso (para mi claro!) sem que haja um sinal meia dúzia de letras que avise o leitor do post
o mau gosto, minha querida cunhada, não poderia eu encontra no poema do Ary... pensaste? erradamente o fizeste
espero ter esclarecido

Fátima Santos said...

e o autor do post, a julgar pelo que comentou, percebeu que eu (eu, sim, não ele) separei bem as duas vertentes do post

Marques Correia said...

Minha rica Mª de Fátima,

recordo-te um poema cheio de sabedoria, do Carlos Tê que diz, a alturas tantas:

Toda a alma tem uma face negra
nem tu nem eu fugimos à regra.


e mais adiante, incita:

Mostra-me o teu lado lunar!

Explicando: o facto de o Ary dos Santos ter sido um rabeta devasso e exibicionista (e estava no seu direito...) não o impediu de (se calhar até o estimulou a) ser um grande poeta, pelo menos a fazer alguns poemas realmente bons - como o que vos deixei no post.

O post começa com o poema de que não gostaste (a interpretação é o que é, mas o poema está - digo eu - muito bem conseguido), numa tónica de abandalhar o defunto, injecta o poema de que gostaste (é - digo eu - uma delícia) e termina em tom claramente apologético.

Mas, desgraçadamente, há muito quem queira que se esconda o lado lunar de quem tem um lado solar deslumbante.

Gostos...

mac said...

Ora batatas que estes gajos são incompreensíveis os dois. Vou-me, à procura da sombra de uma luz que não há...

Marques Correia said...

Curtiste o poema, hã?!